top of page

Intima

 

Do masculino irradia a luz manifesta no feminino.

 

O núcleo de cortiça, elemento tradicionalmente trabalhado pelo homem (o coração de oiro) irradia a luz que se manifesta na alvura do algodão (a alma pura).

 

Trabalhado numa teia delicada e minuciosa que borda uma máscara, afinal desvela os desígnios mais genuínos – a anima – porque é fruto directo do âmago, uma luz vinda do coração.

 

Intima é a alma. A anima.

 

Intima é mantra. O efeito que surte é em nós, ressoa em nós. Em cada célula ressoa o som de cada letra, de forma que se impregna e volta a nós como parte integrante do nosso ser físico. Impregna as células e imiscui-se de volta em nós. Da mesma forma a tentativa de uma máscara inevitavelmente denuncia a personalidade autêntica. No final a máscara é tão mais bonita quanto melhor desvela a personalidade autêntica. Percebe-se, então, que afinal não mascara mas antes expõe e enaltece a anima genuína.

 

Por ser a sensibilidade a criadora ou engenheira da máscara, foi afinal ela que foi retratada. Fica visível, finalmente, a luminosidade interior. Torna-se um foco sensível e estimulante (porque natural).

 

Há um momento, uma acção de dentro, interior, que muta o exterior e expõe o Eu autêntico. Este processo, testemunhado, é estimulante e constrangedor por ser íntimo.

 

A personalidade autêntica já é explícita, para além de implícita.

 

 

*****************************************************************************************************************

 

Íntima é um projecto em que estou a trabalhar há cerca de um ano. Traduzir a sensação de intimidade em atitudes e objectos públicos mas pessoais.

Sou da opinião de que a Arte deve ser de novo humanizada. O meu trabalho em galerias de arte desde 2005 tem-me trazido uma perspectiva da Arte que muito me enriqueceu. No meu sentir, ela existe para criar um elo emocional entre o fruidor e a peça, entre o fruidor e o artista ausente mas presente na sua obra. A Arte existe para ser sentida, para nos fazer sentir.


Tenho desenvolvido este exercício na área do Arts & Crafts, com um trabalho delicado e natural. Trata-se de uma linha de acessórios exclusivos que recriam técnicas intimamente femininas, técnicas que imediatamente remetem para uma tradição oral quase secreta. É em reuniões de várias gerações de mulheres, que as “receitas” são transmitidas num ambiente elitista. A passagem de testemunho implica uma série de regras, de mezinhas e de superstições que são tidas como o valor, a identidade e a assinatura de cada artesã.


Nesta escultura comecei por recuperar o algodão português – aquele que foi verdadeiramente produzido em Portugal, antes de a fábrica ter de fechar portas. Encontrei-o em casas antigas onde a tradição é mantida como brasão de família e sinal de honra.


Interpretei as técnicas e os materiais de uma forma contemporânea e de acordo com o meu percurso artístico e influências culturais. Uma teia de algodão alvo define a máscara de uma superfície. No entanto, não esconde o âmago, pelo contrário desvela-o. É uma capa de matéria que não pretende cobrir mas evidenciar a origem. No interior, um coração de oiro português – a cortiça.


A peça integra um retrato feminino, uma instalação e vários pequenos objectos escultóricos, numa performance. Eu chamo-lhe uma Escultura mise-en-scène. Ela existe para ser sentida e o fruidor terá oportunidade de partilhá-la e tê-la consigo de uma maneira particular.

Todas as peças bebem a solução formal a uma planta delicada que me remete imediatamente para o tema e título desta escultura – Íntima. Falo do dente de leão. Esta planta faz também uma ponte com o espaço em que o projecto se insere – um restaurante. O dente de leão não é só uma planta primaveril delicada e etérea mas é também utilizada na gastronomia e com efeitos medicinais – é responsável por uma purificação do organismo. A pureza do algodão alvo e do coração de oiro português reforça-se neste elemento.


Este projecto foi concebido para o espaço do Olá Ria, num edifício que me diz muito. Foi fábrica de cerâmica em terra de oleiros, arte que me marcou profundamente. Liguei-me irreparavelmente a ela no momento em que percebi que podia esculpir numa roda de oleiro. Aqui partilho essa sensação de proximidade com a espiral encantatória.


Pretendo dar aos clientes do Olá Ria uma experiência de intimidade acolhedora. A espiral da roda de oleiro envolve-nos num momento privado e é isso que o projecto Íntima oferece aos utentes do Olá Ria.
Desde o momento em que tomam uma refeição ou bebida no espaço, são convidados a mergulhar na minha história etérea. São-lhes oferecidas experiências delicadas, para partilhar entre si, em estreita ligação comigo, embora ausente. Deixo-lhes um recado e uma lembrança. Encontram-me mais tarde; virtualmente, encontramo-nos.

  • Facebook Basic
  • Google+ Basic

Manifesto

bottom of page